Quando posso alterar o Regimento Interno do meu Condomínio?

O Regimento Interno, assim como a Convenção, é uma norma condominial registrada em cartório (se estiver inserido na convenção cartório de registro de imóveis, se estiver apartado, cartório de títulos e documentos) que visa a disciplinar o uso das áreas comuns e o bom convívio entre os moradores.

De tempos em tempos vão aparecendo novas necessidades de reajustes nesse documento vez que os hábitos dos moradores sofrem mutações constantes e, portanto, faz- se necessário que tais regras se adéquem a nova realidade.

Via de regra, o RI nasce junto com a Convenção ainda em fase de implantação do condomínio, motivo este pelo qual, muitos os confundem e acreditam que todas as questões são abrangidas em um único documento, o que não procede.

Com o advento do Novo Código Civil, observa-se que não é mais obrigatório constar no corpo da Convenção, como exigido na Lei 4.591/64, podendo, atualmente, ser levado ao registro em documento apartado, contendo somente às regras de funcionamento interno do Condomínio.

Enquanto a convenção norteia as questões mais burocráticas a descrição das áreas privativas e comuns como por exemplo, o rateio das despesas do condomínio, regra das assembleias e suas peculiaridades como convocação, deliberações e quórum, entre outros, o Regimento Interno deve ser utilizado para as questões de convivência entre condôminos e possuidores de maneira dinâmica e pontual.

Portanto, ambos são de suma importância e devem andar lado a lado, muito embora a Convenção esteja em um patamar de hierarquia superior ao Regimento Interno, este rege questões totalmente diversas daquela e que como vimos anteriormente, sofrem necessidades constantes de mudanças.

Em virtude disso a Lei 10.931 de 2004 suprimiu o termo Regimento Interno do artigo 1.351 do Código Civil.

Como era:

Art. 1.351. Depende da aprovação de dois terços dos votos dos condôminos a alteração da convenção e do regimento interno; a mudança da destinação do edifício, ou da unidade imobiliária, depende de aprovação pela unanimidade dos condôminos.

Como ficou:

Art. 1.351. Depende da aprovação de 2/3 (dois terços) dos votos dos condôminos a alteração da convenção; a mudança da destinação do edifício, ou da unidade imobiliária, depende da aprovação pela unanimidade dos condôminos. (Redação dada pela Lei nº 10.931, de 2004)

Destaca-se, portanto, que para a alteração do Regimento Interno não é mais necessário o quórum especial de 2/3 dos condôminos, porém há muita divergência na interpretação.

Há uma corrente que afirma ser necessária a aprovação de 2/3 dos votos de todos os condôminos para a alteração do Regimento Interno, tendo em vista que é o quórum previsto para alteração da Convenção (Art. 1.351 do Código Civil) e em virtude de o Regimento fazer parte da Convenção, o quórum seria o mesmo.

Seguem essa linha de raciocínio Carlos Alberto Dabus Maluf, professor titular da Faculdade de Direito da USP e membro da comissão de juristas que propôs texto na Câmara dos Deputados e Marcio Antero Motta Ramos Marques é sócio, administrador da empresa Maria Cristina Buazar Dabus Advogados Associados.

Escritório de Advocacia ZDL Advogados

Para esta linha de raciocínio, o suprimento do termo Regimento Interno não ignora o fato de que este será determinado pela convenção ( art. 1334, V do Código Civil).

Outra corrente, defendida por Élcio Nacur Rezende, graduado em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (1997), Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (2003) e Doutor em Direito da mesma instituição (2009), professor dos Programas de Pós-graduação em Direito da Escola Superior Dom Helder Câmara e das Faculdades Milton Campos, entende que após o advento do novo Código Civil, o regimento poderia ser alterado pela maioria simples dos presentes apenas em segunda chamada seguindo assim a regra do artigo 1.353 do Código Civil):

Art. 1.353. Em segunda convocação, a assembleia poderá deliberar por maioria dos votos dos presentes, salvo quando exigido quórum especial.

Para aqueles que aderem a essa corrente, a justificativa decorre de que, se de um lado o quórum qualificado na maioria das vezes não chega a ser atingido de modo a impedir decisões condominiais, as decisões importantes em um quórum simplificado, no caso maioria simples, poderia beneficiar apenas uma minoria dando assim um valor ínfimo para o assunto de grande interesse de todos os proprietários.

Em uma terceira corrente, a que vem sendo defendida por João Paulo Rossi Paschoal, assessor jurídico Secovi-SP e já reconhecida pelos nossos tribunais é a de que se o Código Civil traz as regras basilares para o condomínio, à este foi dada autonomia para regrar dentro da sua realidade e que portanto, não tem a legislação nacional o condão de tirar do condomínio um direito constitucionalmente previsto.

Desta forma, para a alteração do Regimento Interno, prevalece o quórum previsto na Convenção e, somente na ausência de previsão é que aplica-se o quórum da maioria absoluta (50% + 1) da totalidade dos condôminos do edifício ou suas respectivas frações ideais.

Vale citar, ainda, o Enunciado nº 248 da Jornada de Direito Civil, promovido pelo Conselho da Justiça Federal, sobre o assunto, além de um precedente jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, os quais caminham, para o entendimento acima defendido. Vale conferir:

Enunciado nº 248 – Art. 1.334, V: O quórum para alteração do regimento interno do condomínio edilício pode ser livremente fixado na convenção.

EMENTA: CONDOMÍNIO EDILÍCIO. RECURSO ESPECIAL. QUÓRUM PARA ALTERAÇÃO DO REGIMENTO INTERNO DE CONDOMÍNIO. MATÉRIA QUE DEVE SER DISCIPLINADA PELA CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO, COM A VIGÊNCIA DA LEI N. 10.931⁄2004, QUE ALTEROU A REDAÇÃO DO ART. 1.531 DO CÓDIGO CIVIL, CONFERINDO, NO PONTO, LIBERDADE PARA QUE A CONVENÇÃO CONDOMINIAL DISCIPLINE A MATÉRIA. ADMISSÃO DE ALTERAÇÃO DO REGIMENTO INTERNO POR MAIORIA SIMPLES DOS CONDÔMINOS, EM INOBSERVÂNCIA À NORMA ESTATUTÁRIA. DESCABIMENTO.

Porém há uma quarta corrente que discorda com o entendimento anterior no sentido de que, se a lei 10.931/04 não repetiu o termo Regimento Interno seria por óbvio que para a alteração deste o quórum seria o da regra comum, ou seja, o voto da maioria dos presentes.

Para essa corrente, que é amplamente defendida por Nicolau Balbino Filho, em sua obra Direito Imobiliário Registral, São Paulo: Saraiva, 2001, pág. 185, a legislação de 2004 veio justamente para sanar os problemas atinentes a titularidade do imóvel pois, existem situações em que demandam outras questões burocráticas e jurídicas para se saber quem é o verdadeiro condômino como por exemplo quando o imóvel constar registrado em nome de uma pessoa que já é falecida, ao passo que no momento da assembleia, comparecem para assinar a lista de presença algum familiar, como a viúva ou herdeiros, ou ainda nos casos da união estável, ou na questão dos inventários que por algum motivo não foram findados, imóveis comprados e não registrados, enfim, casos estes que inviabilizam a reunião de um quórum qualificado.

Assim, para os seguidores dessa linha de raciocínio a Lei prevalece tanto nos prazos Convencionais, independente se anteriores ou posteriores a Lei 10.931/04, e até mesmo judiciais.

Seja qual for a corrente a ser adotada, penso que, sobretudo nos dias de hoje, a divulgação de forma massiva, enquetes e até mesmo reuniões antes da assembleia de alteração, juntamente com um trabalho de conscientização dos condôminos, teria uma repercussão bastante positiva perante o condomínio e consequentemente, refletiria num quórum que ultrapassasse as expectativas.

Escrito por Adriana Victor Ferreira
Advogada e Síndica Profissional
vfcondominial@gmail.com